Todo credor tem o direito de cobrar uma dívida, o problema está quando essa cobrança fere os direitos de quem está sendo cobrado. Segundo a Confederação Nacional do Comércio, cerca de 67% das famílias brasileiras têm dívidas com bancos – instituições que concentram as maiores taxas de juros do mercado. A advogada e especialista em Direito do Consumidor Luciana Roberto di Berardini explica as regras do processo de cobrança e como identificar se ele está irregular ou abusivo.

A princípio, é importante o consumidor entender como funcionam as regras de juros no Brasil. Os juros existem, pois as instituições financeiras precisam ver vantagem no risco de emprestar crédito, com taxas que variam de acordo com o tipo de transação. Segundo o Banco Central (BC) a maior taxa está no cheque especial (323%), seguido pelo rotativo do cartão de crédito (300%) e o parcelamento deste (175%). O juro pode ser considerado abusivo quando ele é muito maior que o necessário para cobrir o risco do empréstimo feito.

“A posição que tem sido reiterada no STJ é a de que, para não serem considerados abusivos, os juros devem ser de no máximo 50% do valor determinado para a categoria de empréstimo no mês que foi ele concedido. Esse valor, com a média da porcentagem do mês e as categorias, pode ser verificado no site do BC”, explica Luciana.

O juro moratório, por sua vez, é uma punição aplicada pelo atraso de contas ou parcelas. Ele é calculado em cima do valor que deveria ter sido pago e aumenta conforme o tempo. Esta cobrança é fixada pela Constituição Federal (§3º artigo 192) ao valor máximo de 12% ao ano. O site do Banco Central disponibiliza a “Calculadora do Cidadão”, ferramenta que averigua se os juros pagos estão acima do permitido por lei a partir dos valores inscritos pelo usuário.

É importante sempre ter em mente que, embora o credor tenha o direito à cobrança, os juros não podem ser abusivos e a forma de cobrança também não, devendo respeitar as regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e do Código Civil. O artigo 42 do CDC determina que o inadimplente não pode ser submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Já as ligações em excesso configuram violação ao artigo 187 da legislação civil, pois atenta contra a paz do consumidor. “Ligações para amigos, familiares e local de trabalho também são irregulares, bem como a negativação ultrapassados cinco anos da dívida ou manter a negativação cinco dias após ao pagamento dela”, salienta a especialista.

Regras para penhora de bens

Caso a dívida ou o seu parcelamento não seja resolvido de forma administrativa e amigável, o banco pode entrar com uma medida judicial contra o devedor, que pode ocasionar no congelamento ou penhora de bens. O salário do trabalhador é impenhorável, mas há a possibilidade de o banco retirar dinheiro da conta corrente para cobrar a dívida do cartão de crédito se o consumidor tiver autorizado a modalidade ‘débito em conta’. “No entanto, essa ação só pode ser realizada se houver previsão explícita em contrato”, explica a especialista.

O credor pode entrar com as medidas judiciais cabíveis no dia seguinte ao vencimento da dívida, mas é comum que o banco aguarde pelo menos dois meses. A Constituição Federal assegura que nada será penhorado antes da finalização total do processo legal. “É possível recorrer da decisão pela penhora de bens. No entanto, o recurso com finalidade meramente protelatória será passível de multa por litigância de má-fé”, afirma a advogada.

Os artigos 831 e 836 do Novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) definem as regras para penhora. Após a decisão judicial, a execução da medida é definida de acordo com valor devido e pela ordem pré-determinada por Lei, sendo esta: dinheiro ou aplicação; títulos públicos com cotação no mercado; títulos mobiliários; e, então, bens. Logo, não cabe ao credor definir o que será penhorado.

“Nenhum bem ou ganho essencial para a subsistência e sustento do devedor pode ser empenhado, isso inclui a casa que ele mora ou o carro usado para o trabalho. Apesar das regras definidas, Luciana orienta que o consumidor tenha um advogado que o instrua e o represente. “É muito comum os consumidores aparecerem no escritório acreditando que possuem direitos que não têm, o que inclusive dificulta a defesa. Sendo assim, é recomendado sempre falar com um especialista”, finaliza.