O trabalho aos domingos e feriados tem uma regulamentação específica e gera uma série de dúvidas sobre os direitos dos empregados e deveres das empresas. No último dia 19 de junho, uma portaria assinada secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Rogério Marinho, ampliou de 72 para 78 o número de setores autorizados a funcionar aos domingos e feriados. O destaque ficou por conta da inclusão do comércio, varejo e de atividades ligadas ao turismo.
A Portaria 604/2019 ampliou os setores econômicos com autorização permanente para que seus empregados possam trabalhar aos domingos e feriados civis e religiosos. Foram incluídos: indústria de extração de óleos vegetais e de biodiesel, indústria do vinho e de derivados de uva, indústria aeroespacial, comércio em geral, estabelecimentos destinados ao turismo em geral e os serviços de manutenção aeroespacial.
O setor que terá maior impacto, segundo os especialistas, será o de comércio, que apesar de a permissão de trabalho nesses dias já estar prevista em lei específica, dependia de convenções coletivas e legislação municipal para colocar seus funcionários para trabalhar em domingos e feriados.
O advogado Pedro Mahin, especialista em Direito do Trabalho e sócio do Mauro Menezes & Advogados, destaca que a nova norma deixou muitas pessoas confusas sobre o que pode mudar.
A verdade é que a apenas o número de categorias aumentou, mas poucos conhecem bem quais são as regras que permanecem e determinam o trabalho aos domingos e feriados.
De acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), todo empregado tem direito a 24 horas consecutivas de descanso semanal remunerado, preferencialmente – mas não somente – aos domingos. A conveniência pública ou alguma necessidade emergencial do serviço pode justificar o descanso semanal em dia diferente do domingo. Quando houver trabalho no domingo ou em dia feriado, o empregado deve gozar do seu repouso semanal remunerado compensatório em qualquer outro dia da mesma semana, explica.
Os especialistas destacam também que o trabalho aos domingos e feriados já era regulamentado pelo Decreto nº 27.048 de 1949. A nova portaria apenas atualiza essa previsão para a realidade dos dias atuais. Além disso, autoriza o trabalho em domingos e feriados em atividades que tenham essa necessidade de funcionamento, como é o caso do comércio, principalmente lojas em shoppings, e estabelecimentos ligados ao turismo, como hotéis.
O doutor em Direito do Trabalho e professor da pós-graduação da PUC-SP Ricardo Pereira de Freitas Guimarães observa que a Constituição Federal também prevê que todo trabalhador, urbano ou rural, tem direito a um repouso semanal de 24 horas consecutivas, preferencialmente aos domingos.
O artigo 7º da Constituição indica que o descanso semanal remunerado deve ser “preferencialmente” aos domingos. Significa dizer que dentro do módulo semanal de sete dias, o trabalhador terá um dia de descanso, repita-se, preferencialmente aos domingos, ou na forma pactuada individualmente ou pela via dos instrumentos coletivos, desde que inserida a folga na mesma semana, afirma.
Mahin ressalta, porém, que o empregado não deve trabalhar continuamente aos domingos, ou seja, deve haver uma escala de revezamento para o trabalhador não exercer suas atividades sempre nos feriados e domingos.
A Portaria 417/1966 do Ministério do Trabalho e Previdência Social estabelece que as empresas legalmente autorizadas a funcionar nos domingos e feriados, qualquer que seja o setor econômico em que atuem, deverão organizar escalas de revezamento, de modo que, num período máximo de sete semanas de trabalho, cada trabalhador usufrua de pelo menos um domingo de folga. No caso específico dos comerciários, o repouso semanal remunerado deve coincidir com o domingo pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, alerta o advogado.
A advogada Lariane Del-Vecchio, do Aith, Badari e Luchin Advogados, reforça que a empresa não poderá obrigar o trabalhador a trabalhar todos os domingos e feriados.
Obrigatoriamente, o repouso semanal remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo, respeitadas as demais normas de proteção ao trabalho e em negociação coletiva, pontua.
O trabalho realizado pelos funcionários das categorias englobadas na nova norma serão pagos como dias normais de trabalho, salienta Danilo Pieri Pereira, especialista em Direito e Processo do Trabalho e sócio do Baraldi Mélega Advogados.
O dia de trabalho realizado por essas categorias em domingos e feriados serão pagos como dias normais, se for dada folga compensatória durante a semana. No entanto, se o trabalho prestado aos domingos e feriados não for compensado com folga, deve ser pago em dobro.
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) entende, segundo os especialistas, que o trabalho prestado em domingos e feriados, quando não compensado, deve ser pago em dobro, sem prejuízo da remuneração relativa ao repouso semanal, inclusive quanto às horas extras.
Banco de horas
O professor Freitas Guimarães informa que pode haver banco de horas para estes trabalhadores.
A jornada de trabalho é considerada normal entre as empresas com autorização para trabalhar aos domingos e feriados, não tendo, via de regra, adicionais de horas trabalhadas. No entanto, se existirem horas extras, elas podem ser compensadas em banco de horas, diz.
Danilo Pieri observa que a reforma trabalhista não alterou as normas da CLT que regulamentam o repouso semanal remunerado e o trabalho em dias de descanso.
O que mudou é que a nova lei trabalhista autorizou a troca do dia do feriado e as escalas de 12 horas de trabalho ininterruptas, intercaladas por 36 horas de descanso ininterruptas, além de instituir novas regras para a compensação de horas extras.
Na visão dos especialistas, os sindicatos de empregados e empregadores continuam habilitados a negociar e regulamentar o assunto de forma diversa da portaria. E as normas coletivas que desautorizavam o trabalho em dias de descanso semanal remunerado e em dias feriados não perdem vigência com a portaria.
Os sindicatos de empregados e empregadores são aptos a negociar regras sobre o trabalho aos domingos e feriados de forma diversa do estabelecido na Portaria 604/2019, desde que não haja supressão ou redução do repouso semanal remunerado e que não seja autorizada a dispensa de compensação, o que prejudicaria a saúde e a segurança dos trabalhadores, alerta Pedro Mahin.
Freitas Guimarães frisa que as categorias que não previam a possibilidade e também não a proibiam são atingidas pela portaria e, provavelmente numa futura negociação coletiva, o tema venha a ser discutido para cada caso.
Aquelas que já previam a autorização desta ou daquela maneira, de forma diferente da portaria, devem ser honradas até o final de sua vigência, pois a existência da portaria não invalida o pacto celebrado entre empresas e ou sindicatos, conclui.
Fonte: JornalContabil